O professor Jose Padua é pioneiro no estudo da História Ambiental (Foto: Divulgação) |
“Autores como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Euclides da Cunha já faziam história ambiental, mas sem usar esse nome. Como campo de estudo, ele surgiu nos Estados Unidos nos anos 70/80 e tive a sorte de conhecer um dos pesquisadores pioneiros, o americano Warren Dean, que na época estava criando o campo de História Ambiental junto com outros pesquisadores americanos. Ele era um brasilianista e escreveu um livro extraordinário, 'A Ferro e Fogo', no qual estuda a história das relações do homem com a Mata Atlântica. Dean foi uma pessoa muito importante na minha formação, era fascinante vê-lo trabalhando, pesquisando nos arquivos e fazendo pesquisa de campo, mesmo já com certa idade. Com ele aprendi que, para entender o que vivemos hoje, precisamos olhar para trás, reconstruir a trajetória humana”, ressalta o professor.
E é do ponto de vista da História Ambiental que o pesquisador explica tragédias como a que aconteceu em janeiro deste ano na Região Serrana do Rio, quando 900 pessoas morreram soterradas por deslizamentos de terra.
“Em 1987, uma tempestade na Região Serrana provocou a morte de 200 pessoas. Em 2011, uma chuva tão forte como aquela fez quase 1.000 vítimas. O que mudou de lá para cá? A ocupação desordenada cresceu. Os ricos querem ficar mais perto da natureza, fugindo dos grandes centros, e começam a construir casas de campo, clubes... Quem tem menos dinheiro também acompanha esse movimento para as serras, construindo habitações precárias. Quando a chuva vem, todos sofrem”, lamenta.
De acordo com o professor, atualmente as questões ambientais ganham repercussão global, mobilizando governos, cientistas e sociedade civil. Mas, se a visibilidade é maior, os problemas também são. “Os carros hoje são menos poluentes. No entanto, temos mais carros. Precisamos avançar mais, mudar nossas atitudes cotidianas, e não pensar no assunto só quando acontecem tragédias. A ignorância não é mais uma desculpa”.
Padua fez mestrado e doutorado em Ciência Política, no ex-Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro) e durante as pesquisas descobriu que já havia uma semente de consciência ecológica nos séculos XVIII e XIX. “Intelectuais como José Bonifácio, Joaquim Nabuco, Guilherme Capanema, entre outros, já discutiam temas que hoje fazem parte de nossa agenda ambiental. Ecologia não é um assunto importado, tem raízes profundas. Os intelectuais não usavam esse nome, mas criticavam o desflorestamento, as queimadas e o desperdício de recursos ambientais. Infelizmente, as idéias não se converteram em movimento social. Temos apenas uma ação concreta importante, a recuperação da Floresta da Tijuca, no século XIX. Na época a cidade sofria com a falta de água e D. Pedro II entendeu que o problema estava ligado ao desmatamento. O imperador determinou o reflorestamento, conduzido pelo Major Manuel Gomes Archer e o administrador Thomás Nogueira da Gama. Mais de 100 mil espécies de mudas foram plantadas. Pela primeira vez em nossa história, fizemos um projeto como esse”, explica o pesquisador, que transformou a pesquisa de doutorado no livro “Um Sopro de Destruição”, lançado em 2002. Mas essa não foi a primeira incursão do pesquisador no mundo literário. Em 1984, Padua lançou o livro “O que é Ecologia”, pela coleção Primeiros Passos, junto com Antonio Lago, obra que vendeu mais de 100 mil exemplares.
O professor, que trabalhou por seis anos no Greenpeace como coordenador da Área de Florestas da América Latina, antes de voltar para a vida acadêmica, atualmente compara a destruição da Mata Atlântica com a devastação da Amazônia. E não é otimista em relação ao futuro. “Perdemos quase toda a Mata Atlântica, só que ela demorou mais tempo para ser devastada. Já a Floresta Amazônica está sendo destruída muito rapidamente. Mas, o que ouço as pessoas falarem é: ‘Ah, temos muito mato ainda’. Existe o mito da natureza inesgotável e da fronteira sempre aberta. Vivemos a cultura de que podemos desmatar em nome do progresso. Quando não se pode tirar mais nada da terra, parte-se para outro ponto e a destruição recomeça. Temos que aprender a valorizar nossa natureza tropical, não basta cantar em verso e desprezar na prática. Espero que não precisemos perder a Amazônia como aconteceu com a Mata Atlântica para aprendermos a lição que a História Ambiental nos dá”, completa.