Estadão Sustentabilidade - Assim que Donald Trump assumiu a presidência dos Estados Unidos, a página dedicada às mudanças climáticas que ficava hospedada no site da Casa Branca foi retirada do ar.
Ao entrar na página www.whitehouse.gov/energy/climate-change, que reunia informações sobre o problema e as políticas de Obama para lidar com o assunto, o internauta recebe a seguinte mensagem: “The requested page “/energy/climate-change” could not be found” – a página requisitada não pode ser encontrada.
Pior que isso, toda e qualquer menção à “climate change” (mudanças climáticas) ou “global warming” (aquecimento global) desapareceu do site. Buscas com as palavras resultam em nada encontrado.
O site Motherboard fez um print screen de como era a página nesta manhã.
E é assim que ficou logo que Trump fez o juramento de posse.
Ao mesmo tempo, foi divulgado o “America First Energy Plan”, novo plano de energia do país dentro do princípio de “América Primeiro”, que basicamente elimina o Plano de Ação Climática de Obama, que estabelecia regras para a redução de emissões de gases de efeito estufa do setor de energia.
“O presidente Trump está comprometido a eliminar políticas danosas e desnecessárias como o Plano de Ação Climática das regras americanas. Levantar essas restrições vai ajudar os trabalhadores americanos, aumentando os salários em mais de US$ 30 bilhões ao longo dos próximos sete anos”, diz o texto.
“América Primeiro” foi um dos motes de campanha de Trump e foi repetido diversas vezes nesta sexta-feira (20) no discurso de posse do magnata.
O Plano de Ação Climática, de 2013, estabelecia a redução da poluição de carbono nos Estados Unidos, propunha caminhos para o país se preparar para os impactos das mudanças climáticas e para liderar os esforços globais de combate ao problema.
Foi, dois anos depois, complementado pelo Plano de Energia Limpa, esse sim com regras mais concretas para a redução das emissões de gases de efeito estufa no setor de energia e que foi a base para os compromissos dos EUA assumidos junto ao Acordo de Paris. A princípio isso continua valendo, por enquanto. Até segunda-feira Trump deve assinar mais de 200 decretos. A extensão do impacto sobre políticas existentes ainda está por vir.
Por outro lado, o texto fala que o “presidente Trump vai reorientar a EPA (Agência de Proteção Ambiental) em sua missão essencial de proteger nosso ar e água”.
Obama só conseguiu dar força ao seu Plano de Energia Limpa justamente porque conseguiu encaixá-lo no Ato pelo Ar Limpo (Clean Air Act) da EPA, que regula os poluentes no país. A manobra foi considerar que o gás carbônico, principal gás de efeito estufa, como também um poluente. A estratégia é polêmica e depende da compreensão do que é poluente. Apesar de o CO2 não ser um gás que faz mal diretamente à saúde, ao promover as mudanças climáticas ele sim estaria afetando milhões de pessoas e, portanto, deveria ser regulado como outros poluentes.
Essa frase do plano de Trump sugere que ele pode readequar os limites de ação da EPA, limitando as ações de combate às mudanças climáticas.
Incentivo ao carvão. No extremo oposto, o novo documento sugere apoiar um produto totalmente danoso à saúde das pessoas e do planeta. “A administração Trump também está comprometida com a tecnologia de carvão limpo e em reviver a indústria americana de carvão, que vem sendo ferida por muito tempo”, diz o plano.
O texto, porém, traz uma contradição em si ao dizer que o governo vai abraçar a revolução do gás natural e de xisto. Foi justamente essa revolução que nos últimos anos reduziu o custo da energia nos Estados Unidos e também as emissões de gases de efeito estufa do país. Em 2008, o gás respondia por 21% da geração de energia do país, hoje por 33%. E apesar de ser um combustível fóssil, é muito menos poluente que o carvão.
Se Trump pretende continuar incentivando isso, os preços do gás provavelmente vão continuar mais competitivos, a não ser que ele coloque incentivos pesados ao carvão, o que economicamente não é mais vantajoso. Sem isso, ficará difícil viabilizar uma indústria já fadada ao fim.
Não há nenhuma linha sequer, porém, sobre energias renováveis neste novo plano de energia. O investimento em formas limpas de energia, como solar e eólica, era uma bandeira de Obama e vem crescendo nos últimos anos.
“Hoje as energias renováveis já geram mais novos empregos nos Estados Unidos do que o setor de combustíveis fósseis”, lembra Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima. “Acredito que a extensão das medidas não vai ser proporcional ao impacto do anúncio delas. A realidade é maior que um presidente, a transição energética está acontecendo no mundo todo”, diz.
“É claro que ações como essas assustam. Num primeiro momento, são um choque, mas aí lembramos que o mundo é maior que os Estados Unidos e que a roda da energia limpa está girando. Isso vai ter limites”, complementa.